As lágrimas do povo se misturam ao
suor e a poeira, que se dissipam ao som feroz das máquinas e da truculência policial
destroçando os barracos; barracos que além de Madeirit, restos de construção e
lonas eram feitos de esperanças e trabalho duro de um povo que está fora do
campo de visão das políticas públicas e que escolheu não se render ao crime e
outras mazelas além das que carregam, escolheram Lutar, trabalhar, sobreviver.
Essa era a cena do dia 27 de março de 2013 na terceira área ocupada pelo MOTU, Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos,
na cidade de Barra dos Coqueiros.
A ocupação Vitoria da ilha iniciou a
9 meses atrás em uma área obsoleta, descumpridora da função social da terra,
próximo a H Dantas, teve a ordem de despejo capitaneada pelo atual a
secretário de assuntos jurídicos, o senhor das contradições José Carlos Góes
Montalvão o defensor do proprietário. De modo que a vitória judicial do irregular
Dono da área, senhor Antístenes, também dono de uma empresa, a Vega Marítima,
tendo essa um deposito no município, porém sem registros, forçou as quase
duzentas famílias na época a buscarem um novo local que sanasse o seu grande
problema: O direito constitucional a Moradia, direito que lhes é vetado a partir
do momento em que se torna inconciliável pagar um aluguel e comer, viver sobre
um teto sem teto, dentre outras situações ultrajantes comuns a eles e elas. E
quem são eles e elas? É o povo esquecido dessa Barra dos Coqueiros de 59 anos de
invisibilidade de justiça social, são carroceiros, flanelinhas, cozinheiras,
pescadores, donas de casa, também pessoas da grande Aracaju, pessoas que não
são o suficientemente “grandes” para serem enxergadas por ela. A busca dos
ocupantes do Vitória da Ilha organizados pelo MOTU chegou a uma nova área, uma
área de interesse social-AIES TIPO 1, segundo o Plano Diretor Sustentável e
Participativo de Barra dos Coqueiros, uma área que assim como outras demarcadas
na lei municipal tem como um de seus fins prioritários a construção de
habitações populares, contudo a área desapropriada pelo Decreto nº021/2008 de
01 de fevereiro de 2008 (Prefeito Ayrton Martins, decreto de
desapropriação) e pelo Decreto nº
361/2009 de 07 de agosto de 2009 (Prefeito Gilson dos Anjos, decreto de desapropriação
corrigindo as medidas da área) era um grande pasto estéril, e assim voltou a
ser, pois novamente após 6 meses de ocupação o judiciário de Barra dos
Coqueiros, com a conivência e inoperância do Executivo, Prefeito Airton
Martins, e do Legislativo-Vereadores, decidiu em favor dos “Donos” de uma área
desapropriada e prevista para fins de habitação em duas leis municipais, pois
além do plano diretor a área esta
mapeada também no Plano Municipal de Habitação, sendo assim sem teoricamente
poder vender ou executar qualquer obra, mas a coerência legal não impediu a
força dos interesses obscuros, e
novamente as agora 172 famílias, foram despejadas a própria sorte, e sem
esmorecer na briga legítima, ocuparam o terreno público da futura praça da
juventude, um lugar inóspito para qualquer pessoa viver, as margens da rodovia
que da acesso a ponte Construtor João Alves.
Com isso acaba por desnudar um
problema muito maior do que o das 172 famílias do MOTU, chama atenção para a Barra
feia onde existem pobres sem casa e sem tantas outras coisa básicas, a Barra
que 2008 apresentava um déficit de moradia de mais de 1000 habitações
contabilizadas pelo Plano Municipal de Habitação, que tratava das ocupações do
Canal Guaxinim, Atalainha, Goré e Suvaco do Cão, um cultivo cômodo da pobreza
se compararmos a dados de IBGE 2000 em um relatório do ministério das cidades
que mostra 8,3% das habitações eram precárias e subnormais o que representava
362 habitações, e o hoje os últimos dados do senso de 2010 apontam para a
manutenção desse estado com aproximadamente 966 pessoas vivendo apenas nos
aglomerados subnormais (ocupações) sem contar as áreas em situação precária.
Assim podemos ver que os problemas só
se avolumaram, pois esses dados ainda parecem pequenos perto do crescimento da
problemática nos últimos anos posteriores a pesquisa, pois nada vem sendo feito
e por isso voltamos à cena do inicio desse texto: o despejo das famílias do Motu
da quarta-feira dia 27 de Março, as vésperas da semana santa, em uma cidade
predominantemente cristã, cuja padroeira é Santa Luzia, nada se vê de reflexão
e renovação de esperança como prega essa época, apenas as máquinas do PAC-Programa
de Aceleração do crescimento que deveriam ser usadas para erguer, destruíam. E por
quê? Mais do que as alegações superficiais de mandatos de uma justiça que tem
donos e por eles é feita, o MOTU, a ocupação vitória da ilha era uma ferida
exposta da cara de uma Barra que se vende a cada dia mais vergonhosamente para
o capital imobiliário, vemos Alphavilles e Damhas fazendo cursinhos de educação
ambiental prometendo esmolas a instituições, engodos para enganar os tolos
diante dos inúmeros impactos e deslocamentos de prioridades que já geram para o
município. O que víamos direitos humanos desrespeitados, moveis e animais de
estimação esmagados, roupas de bebe, bonecas abandonados no chão, era um cenário
de batalha, ou melhor, de luta, a luta de classes; a luta do Motu não
representa hoje na Barra apenas a luta por moradia mais uma luta por
transformação social em um cidade loteada para os ricos de mão dada com os
ditos representantes do povo, fica para estes eleitos uma frase do educador
Florestam Fernandes: “Não existe
neutralidade possível: o intelectual(governantes e magistrados) deve optar
entre o compromisso com os exploradores ou com os explorados”.
E por fim fica a força desse povo que fez das
tripas coração para se manter de pé diante desse novo despejo ao qual estavam
buscando recorrer até a última hora, e diante do abandono e das falsas promessas do município o povo foi
abrigar-se na única quadra do município, que inclusive foi indicação do
secretario de assuntos jurídicos, citado anteriormente, junto ao secretario de comunicação que no primeiro
momento disseram que a prefeitura se comprometeria também com o transporte para
o local, o transporte da prefeitura foi suspenso e hoje há representante que
negue a cessão da quadra Capitão Juca , o fato é que eles estão lá e
permanecerão até que, esperamos todos, se forje pelo poder público uma solução mais
adequada. O fato é que resistem em meio a tantos ataques, ataques sim! Pois até
prisões foram deflagradas contra pais de família da ocupação, sobre o julgo de
roubo de energia, pois gostaria de saber como seria feito se os habitantes em
áreas irregulares fossem todos presos por ligar uma geladeira! Deveriam ser
presos os que roubam a condição desses seres humanos de morar em lugar onde
tenham acesso seguro a redes elétricas. O fato é que estão lá cozinhando juntos,
dividindo pertences e sonhos por dias melhores, tentando fazer brotar uma flor
do impossível chão. Quando morar é
um privilégio ocupar é um direito! Na luta por moradia Sejam Realistas, Exijam
o Impossível!
Por Marina
Franca Lelis Bezerra
Militante do Coletivo Sejam Realistas! Exijam o
Impossível! da Barra dos Coqueiros
Engenheira Agrônoma,
Mestranda em Desenvolvimento e Meio-Ambiente/UFS
Moradora da Barra a 21
anos dos seus 24 anos de idade.